sexta-feira, 18 de março de 2011

QUARESMA 2011- 2

As tentações de Jesus: o pecado do homem, da religião e do mundo

Os evangelhos sinóticos nos trazem que Jesus foi tentado pelo diabo. Marcos apenas cita o fato, enquanto que Mateus e Lucas desenvolvem paralelamente o conteúdo da tentação, provavelmente recebida de uma fonte comum.
Não estamos perante um fato histórico, além de que Jesus poderia ter se retirado ao deserto e praticado o jejum, como outros judeus piedosos fariam. Estamos perante uma narrativa fortemente teológica de conteúdo tipológico e simbólico. Talvez, poderíamos estar ainda, numa expressão teológica da autoconsciência do próprio Jesus
Os quarenta dias de Jesus no deserto lembram os quarenta anos que passou Israel à procura da Terra prometida por Deus. Também o povo de Deus foi tentado no deserto e sucumbiu à tentação da fome, do bezerro de ouro ou do ouro do bezerro e etc. Jesus, não.
As tentações de Jesus simbolizam o pecado de todo homem, tanto em sua dimensão pessoal, quanto religiosa e social. Vejamos:
1ª tentação: “Se és filho de Deus, faz que estas pedras se tornem pães”. Seria a tentação de usar em proveito próprio aquilo que Jesus é. Aparentemente, não haveria problema nenhum. É uma tentação bem sutil, pois se trata de cair no egoísmo ou no egocentrismo. Jesus não se coloca a si mesmo, apesar da fome física, como ponto de referência ou como centro de si mesmo. Por isso responde: “Não só de pão vive o homem, mas de toda Palavra que sai da boca de Deus”, que é tanto, quanto discernir claramente: o centro de sua vida está no próprio Deus, não nele mesmo e, deste modo, agir em conseqüência.
2ª tentação: o diabo conduz Jesus até a parte mais alta do Templo de Jerusalém e lhe diz: “Se és Filho de Deus, joga-te daqui para abaixo, porque está escrito que ‘Ele enviará seus anjos que te levarão em suas mãos para que teu pé não tropece em alguma pedra”. Podemos ver alguns aspectos nesta tentação que é francamente religiosa:
a)      Jesus é situado pelo diabo na parte mais alta do templo, por cima do próprio santuário de Deus. É uma situação de domínio, de poder sobre os outros mortais, que pululam pela grandiosa esplanada do Templo. É o lugar de Deus e não de homem algum.
b)      O diabo faz citação da Sagrada Escritura, da própria Palavra de Deus que é manipulada em função de seus interesses, que se resume em colocar um homem por cima de outros homens, de colocar um homem no lugar que é de Deus e que atenta frontalmente à fraternidade humana.
c)       A tentação é de fazer Jesus voar com anjos incluídos, de ser mais do que os outros por meio da religião, de fazer uma mágica ou um milagre, de ser o tal, no fim, de usar o poder Deus em seu próprio interesse.
d)      “Não tentarás o Senhor teu Deus” –responde Jesus, que desmascara a manipulação da Sagrada Escritura, que até hoje se faz, em função de interesses de poder religioso sobre os outros que , não raramente se mistura com o poder econômico ou influência social, etc..
e)      Porém, para Jesus, só Deus é Deus. E nós, todos, sem exceção, somo seres humanos, iguais. O restante não passa de ideologia religiosa.
f)       Porque, entre nós, não pode ser assim, diz o Senhor em outro lugar, “quem quiser ser o primeiro seja o último, e quem quiser ser grande seja o servo de todos”.
3º tentação: Mais uma vez  o diabo conduz Jesus para um monte muito elevado para mostrar todos os reinos do mundo e suas riquezas. E diz: “tudo isto te darei se te ajoelhares diante de mim e me adorares”. Dito assim, fica grosseiro e evidente que não, mas podemos ver  sutilmente que:
a)      O diabo coloca a Jesus no lugar mais alto do mundo, como sinal de senhorio e de domínio sobre todos os países e sua “glória” (ou riqueza). O domínio mundial.
b)      Que, mais modestamente, é a tentação do poder político ou econômico sobre os outros, que.
c)       Se traduz em ambições terrestres desmesuradas.
d)      A reação de Jesus é contundente: “Afasta-te de mim, Satanás, porque está escrito: somente a teu Deus adorarás, somente a Ele prestarás culto”.
e)      “Não podeis servir a dois senhores... Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”, dirá Jesus em outro contexto.
f)       A tentação do poder político e econômico, altamente destrutiva (temos uma história de guerra e destruição até hoje mesmo), nos tira da verdade mais fundamental e primeira: todos somos Adão, todos somos uma única humanidade que.
g)      No dia em que entrarmos em profunda ad-oração a Deus, isto é, quando Deus seja o centro de nossas vidas, como acontece em Jesus, nos tornará a todos (sem sobrar um só), iguais e fraternos.
h)      No restante dos Evangelhos encontraremos em Jesus a resposta existencial e positiva de Jesus ao seu (e nosso) Deus, que nos transmitirá que é seu (e nosso) Pai.
Quaresma é tempo de graça, de procurarmos a conversão. Isto quer dizer: nos esvaziarmos de nós mesmos e deixarmos nos preencher pela Presença, pela Palavra, pelo Amor de Deus. É nosso ponto de partida e de chegada.

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