Roxo. Comemoração de todos os Fiéis Defuntos, Solenidade
Hoje reverenciamos nossos irmãos falecidos. A Igreja dá à data litúrgica de 2 de
novembro o título de “Comemoração de todos os fiéis defuntos”. É um dia no qual
nós, cristãos, rezamos principalmente pelos nossos irmãos na fé, ou seja, os
batizados em Cristo, que já morreram. Claro que toda a humanidade – e não só os
cristãos – são objeto da oração e solicitude da Igreja, que é Corpo de Cristo,
o Salvador de todos! Diariamente, na Santa Missa, a Igreja recorda não somente
os “nossos irmãos que partiram desta vida”, mas também “todos aqueles cuja fé
só vós conheceis”!
Seja como for, o
Dia de Finados coloca-nos diante de uma questão fundamental para nossa
existência: a questão da morte. Nosso modo de enfrentar a vida depende muito do
modo como encaramos a morte, e vice-versa! Atualmente, há quatro modos
possíveis de encará-la, de colocar-se diante da realidade da morte. Senão
vejamos:
Há aqueles – e
não são poucos – que cinicamente a ignoram. Vivem como se um dia não tivessem
que morrer: preocupam-se tão somente com esta vida: comamos e bebamos! Em
geral, quando vão a um sepultamento, conversam o tempo todo sobre futebol,
política ou quaisquer outros assuntos banais e rasteiros. São pessoas rasas,
essas; pessoas que nunca pararam de verdade para se perguntar sobre o sentido
da vida e, por isso mesmo, não vivem; sobrevivem, apenas! Estas, quando tiverem
que enfrentar a própria morte, que vazio, que absurdo encontrarão! É o preço a
pagar pelo modo leviano com que viveram a vida! Isto é triste porque quando o
homem não pensa na morte, esquece que é finito, passageiro, fugaz e, assim,
começa a julgar-se Deus de si mesmo e tudo que consegue é infernizar sua vida e
a dos outros. São tantos os exemplos atuais…
Há ainda aqueles
que diante da morte se angustiam, apavoram-se até ao desespero. A morte os
amedronta: parece-lhes uma insensatez sem fim, pois é a negação de todo desejo
de vida, de felicidade e eternidade que cresce no coração do homem. Estes
sentem-se esmagados pela certeza de um dia ter que encarar, frente a frente,
tão fria, tirana e poderosa adversária. Assim, querendo ou não, podem afirmar
como Sartre, o filósofo francês: “A vida é uma paixão inútil!”
Há também um
terceiro grupo: o dos otimistas ingênuos. Vemo-los nessas seitas esotéricas de
inspiração oriental e em todas as doutrinas reencarnacionistas. A Seicho-no-iê,
por exemplo, afirma que o mal, a doença, a morte, são apenas ilusão: a
meditação, o autocontrole, a purificação contínua, podem libertar o homem de
tais ilusões; o Espiritismo, proclama, bêbado de doce ilusão: “A morte não
existe. Não há mortos!” – É esta a afirmação existente num monumento ao
nascimento do Espiritismo moderno, em Hydesville, Estados Unidos. Não há morte
para nos agredir; há somente uma desencarnação!
Mas, há ainda um
último modo de encarar a morte, tipicamente cristão. A morte existe sim! E dói!
E machuca! Não somente existe, como também marca toda a nossa existência:
vivemos feridos por ela, em cada dor, em cada doença, em cada derrota, em cada
medo, em cada tristeza… até a morte final! Não se pode fazer pouco caso dela:
ela nos magoa e nos ameaça; desrespeita-nos e entristece-nos, frustra nossas
expectativas sem pedir permissão! O cristão é realista diante da morte;
recorda-se da palavra de Gn 2,17: “De morte morrerás!” Então, os discípulos de
Cristo somos pessimistas? Não! Nós simplesmente não nos iludimos: sabemos que a
morte é uma realidade e uma realidade que não estava no plano de Deus para nós:
não fomos criados para a ela, mas para a vida! Deus não é o autor da morte, não
a quer nem se conforma com ela! Por isso mesmo enviou-nos o seu Filho, aquele
mesmo que disse: ”Eu sou a Vida; eu sou a Ressurreição!” Ele morreu da nossa
morte para que nós não morramos sozinhos, mas morramos com ele e como ele, que
venceu a morte! Para nós, cristãos, a morte, que era como uma caverna escura,
sem saída, tornou-se um túnel, cujo final é luminoso. Isto mesmo: Cristo
arrombou as portas da morte! Ela tornou-se apenas uma passagem, um caminho para
a nossa Páscoa, nossa passagem deste mundo para o Pai: “Ainda que eu passe pelo
vale da morte, nenhum mal temerei, porque está comigo!” Em Cristo a morte pode
ser enfrentada e vencida! Certamente ela continua dolorosa, ela nos
desrespeita; mas se no dia a dia aprendermos a viver unidos a Cristo e a
vivenciar as pequenas mortes de cada momento em comunhão com Senhor que venceu
a morte, a morte final será um “adormecer em Cristo”.
Por tudo isso, o
Dia de Finados é sempre excelente ocasião não somente para rezar pelos nossos
irmãos já falecidos, mas também para pensarmos na nossa morte e na nossa vida,
pois “tal vida, tal morte!
Por: Dom
Henrique Soares
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